quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Uma linda história de amor

Postado em julho 19, 2013 por Adriana Avelar em Direto da Cozinha

Já falei aqui da minha grande admiração por minha avó. E junto com ela vem uma grande admiração também pelo berço em que ela nasceu e me proporcionou crescer. Meu bisavô João Quirino de Moraes teve 15 filhos, dentre eles minha querida avó nascida em 1915. Eu cresci junto a todos os irmãos da vovó e primos, sempre tive o grande prazer de ter primos e tios muito presentes em minha vida.
Certa vez procurei a tia Audília, uma das irmãs mais novas da vovó para ouvir histórias que ela tinha para me contar. Foi então que eu soube que quando os 15 irmãos ainda pequenos moravam em uma fazenda, na casa do vovô Quirino, cada um tinha sua função e “a Maria não cuidava da comida, ela era mesmo boa de costura, cada filho trabalhava no que tinha maior aptidão” a irmãzinha dela me contou. Realmente minha avó era também uma exímia costureira.
Para nós filhos e netos da vovó Maria ela foi a melhor cozinheira que já existiu. Cozinhava uma galinhada pra ninguém botar defeito, paneladas e panelinhas de comida espalhadas em uma mesa de 2 metros de comprimento cheias de amor. Ela começava a servir e brotavam panelinhas de dentro da cozinha, uma especial pra cada convidado. Eu gostava da abobrinha ralada com ovo mexido, o meu pai gostava dela em rodelas grossas, pois ela fazia para os dois gostos. E assim durante o almoço descobríamos que cada um de nós tinha passado pela cabecinha dela durante a manhã para preparar aquela mesa farta.
Não importavam quantos vinham para o almoço, comida nunca faltava, porque amor nunca faltava. Ela podia ter acabado de preparar a comida para um batalhão e sentar para comer que se chegasse alguém ela corria, pegava um prato, talheres e já servia o convidado para não correr o risco de ele não provar de seu amor.
E assim ela usava seus dotes para transmitir amor. A família grande do vovô João Quirino sempre a admirou pela sua costura perfeita e ela fazia uma colcha de retalhos realmente muito linda, cortava todos os retalhos minuciosamente do mesmo tamanho e os juntava em forma de leque, fazendo uma colcha de leques de retalho, uma arte sem igual.
Hoje a vovó não está mais conosco, faleceu em 2006 aos 91 anos mas as marcas do seu amor permanecem intactas.
Todos os anos nos encontramos no último sábado do mês de julho, juntamos todos os filhos, netos e bisnetos do vovô, cerca de 200 pessoas. Esta festa já é uma grande tradição da família que começou a 25 anos.
Enquanto viva, a exímia costureira passava o ano todo fazendo uma colcha de retalhos que era rifada ou leiloada durante essa festa. O tio João, o irmão mais novo e animado, desfilava pela festa com a colcha nas costas mostrando a todos a bela arte feita por sua querida irmã. A colcha foi tradição tanto quanto a festa enquanto ela era viva.
E agora meados do mês de julho, estamos ansiosos a uma semana da festa mais esperada do ano. Hoje me encontrei com a tia Maria Helena, única filha mulher da minha avó e conversando sobre os detalhes da festa, lamentamos a falta da colcha, foi então que ela se propôs a se desfazer de uma de suas colchas deixadas pela vovó: doar para a festa, para que a memória dela possa ser revivida através da colcha e de suas tão prendadas mãozinhas.
Eu era muito apegada a minha avó até pelo lindo amor com a cozinha que temos em comum e eu sempre sofri muito a falta dela e reclamava principalmente o fato de ela não ter me deixado suas receitas. Mas hoje depois dessa linda atitude de minha tia em doar uma de suas valiosas lembranças, vejo que eu estava sendo egoísta, afinal de contas o amor não pode ser vivido individualmente. Eu sou a única neta que herdou a habilidade de cozinhar se eu tivesse um livro com as receitinhas dela, eu traria a tona as lembranças enquanto cozinhava, sozinha na cozinha e essa nunca foi a intenção. Ela me ensinou a preparar um único prato: o nosso tradicional lombo de Natal, reforçando o recado de usar o dom para replicar amor.
Certa vez ela ganhou um saco de milho e aos 87 anos para fúria geral da família, ela passou o dia fazendo pamonha. Todos ficaram bravos porque ela já estava fraquinha, não podia mais fazer esforço, e fazer pamonha dá muito trabalho. Como de costume, ela fez pamonha do gosto de cada filho e eu, como cheguei junto com meu pai para “dar bronca” porque ela tinha “aprontado e feito pamonha” pude ver todas as variedades que ela tinha feito, incluindo uma especial para o filho mais novo: pamonha assada. Ela só me deixou provar, falou que da próxima vez fazia pra mim mas aquela eu tinha de deixar para o meu tio. Provei e me apaixonei: sabor, textura, aroma, amor sem igual!
Assim hoje compartilho uma receita de bolo de milho que parece pamonha assada, mas obviamente bem mais simples, batida no liquidificador.
Falsa Pamonha Assada
Ingredientes:
2 xícaras de chá de milho verde fresco (ou 2 latas de milho sem a água)
2 xícaras de chá de açúcar
1 xícara de chá de leite
5 ovos inteiros
1 vidro pequeno de leite de côco
4 colheres de sopa de queijo ralado
4 colheres de sopa de farinha de trigo
4 colheres de sopa de manteiga
1 colher de sopa de fermento em pó

Modo de fazer:
Bater todos os ingredientes no liquidificador e dispor sobre uma assadeira retangular previamente untada com manteiga. Leve ao forno pré-aquecido a 180 graus por 40 minutos ou até que tenha consistência de um bolo assado (teste do palito).
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