sábado, 4 de outubro de 2014

Despedida

Era um sábado ensolarado, dia 25 de agosto de 2012 e eu passeava pelo mercado de Santo Amaro. Eu estava ansiosa, naquele dia eu comemorava meus 30 anos completados no dia anterior. Tinha uma lista enorme com ervas e plantinhas para decorar o local onde seria o almoço de aniversário e ali em pé na floricultura eu te vi. Era um bebê, tinha somente uma mini folhinha e por ela eu nem conseguia saber que se tratava da rainha das flores. O floriculturista me disse ser um pé de mini orquídea que ele tinha plantado há 2 dias e que não iria vender. Pedi que me vendesse você, eu estava encantada e queria me dar um presente de aniversário e você era o presente mais especial que encontrei para me dar!

Peguei você no colo e te levei até em casa, ao chegar já acomodada no seu vidrinho de pedras eu lhe sentei no meu colo e conversamos pela primeira vez. Já logo percebi que você era das minhas e gostava de carinhos pela manhã e abraços apertados ao anoitecer. Assim começamos a ter uma relação de cumplicidade diária, eu tinha em você meu ponto forte e ao mesmo tempo via você crescendo a uma velocidade impressionante. Minha viagem para a Austrália em 5 meses já estava certa e sabíamos que aqueles encontros diários deixariam de acontecer.


Você chegou a florir, deu uma linda flor amarela com detalhes em rosa. A flor caiu, a haste ali continuou e nós cuidamos para que ela se mantivesse viva e nos desse uma nova flor no ano seguinte. Cuidávamos muito uma da outra.

Uma semana antes da longa viagem sentamos eu, você e papai e eu pedi que vocês dois se cuidassem, que cuidassem um do outro na minha ausência, vocês pareceram se dar bem. Papai era mais frio, eu sabia que você sofreria, mas também sabia que os momentos de carinho que teria com ele seriam de muita intensidade em que ambos estariam naquele momento lembrando de mim e se sentindo acariciados.

Eu fui e você ficou... Confesso que por lá me lembrei de você por algumas vezes, senti falta da minha amiga ouvinte e cheguei a abraçar outras plantas buscando seu conforto, temia que você não estivesse mais viva na minha volta pra casa.


Seis meses depois voltei a São Paulo, me lembro que após 24 horas de vôo no caminho pra casa com meu pai perguntei por todos os parentes, amigos, todos estavam bem. E foi então que veio a pergunta: “papai, e as plantinhas, estão vivas, o senhor cuidou delas?” – “cuidei sim, algumas morreram” – Ele repondeu. “A orquídea está viva?”. “Não sei minha filha.” – Papai já tem mais de 70 anos e nunca se aproximou muito das plantas, não sabe qual é a orquídea, ainda mais que aquela em especial só tinha folhas grandes por carinhos diários mas as flores ainda demorariam um tempo para vir.
Finalmente cheguei em casa e vi você: estava fraca, abatida, porém viva e a minha espera. Eu te peguei no colo, alimentei, fiz carinho e fui dormir com a certeza de que teríamos novamente uma a outra. Cuidei da sua haste que estava começando a brotar, juntas pesquisamos formas de deixa-la em pé...

Quase um ano depois da minha volta surgiu uma nova viagem, eu passaria 45 dias em Salvador durante a Copa do Mundo. Você já tinha resistido por 6 meses, facilmente resistiria a minha falta por aqueles dias.
Recomendei cuidados ao papai e “partiu praia”! Confesso que nestes dias não me lembrei de você, eu tinha a certeza de que estaria bem cuidada.

Chegando novamente em casa após longa viagem te vejo num canto, embaixo do tanque de lavar roupas, entristecida, cercada de outros 3 vasos mortos. Te peguei no colo, fiz carinho, pedi desculpas, mas já era tarde, suas folhas estavam doentes.


Tentei por mais 2 meses te fazer voltar a vida, mas a doença se alastrava em uma velocidade impressionante, sua haste já estava morta e você precisava de outra vida para seguir, daquelas pedras você já não tirava mais a energia. E foi numa mesma manhã de sábado que nos despedimos, eu escolhi te prender na árvore e te doar para meus vizinhos. É triste saber que você não está mais na minha mesa de café todos os dias, mas ao mesmo tempo sei que está na minha calçada, preferi compartilhar seu sorriso do que perde-lo para sempre em uma morte lenta e desleal.

Naquele 25 de agosto eu te pedi ao floriculturista porque estava carente e precisava de atenção. Você também ali me olhou e pediu colo. Hoje 2 anos depois seguimos nossos caminhos com a certeza de que tivemos os objetivos cumpridos: nos fortalecemos nesta relação! Espero ainda ver suas flores em um futuro próximo, agora que você é independente e vive abraçada a árvore do jardim do prédio onde moramos eu e meu pai. Vou passar por lá sempre que der pra dizer um “Oi”...

Adeus minha linda mini-orquídea!


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